Hum… os momentos que formaram minha memória gustativa consciente... rsrsrrs
Acho que isso está mais relacionado com as sensações que os gostos provocam do que qualquer outra coisa, gostos e texturas... Se fecho os olhos e penso na minha infância, logo de cara vem uns 5 momentos, momentos que ajudaram a formar essa cozinheira que voz fala... Para ler o primeiro texto sobre essas memórias, cliquei aqui.
O primeiro é o momento bolinho de chuva! Ahhh o bolinho de chuva... férias de Julho, na casa de campo em indaiatuba, que erroneamente sempre nos referimos como “o sitio”, mas que não é um sítio... rsrsrsr
Passávamos o mês todo lá,eu, meu irmão, Beto, e meus primos, um time que embora mutável geralmente consistia na mesma turma: Nati, Nati, Bruno e Gui, e invariavelmente algum agregado, com a minha babá, a Bá! Eu lembro de detestar essas férias, odiava me despedir dos meus pais no domingo e saber que eles vinham para São Paulo e que eu ficaria lá, eu sofria, haha como toda criança sofre sabe? Como se aquilo fosse o fim do mundo! Chorava, muitas vezes ficava em prantos até dormir...
Mas eu me divertia muito, e quando não estava me divertindo, ou o frio, ou a chuva se tornavam um empecilho para a brincadeira, aparecia a Bá, com um monte de bolinhos de chuva quentinhos, recém passados no açúcar, eu comia fácil fácil uns 15! Era o momento que eu sabia, que até quando as coisas não estavam muito bacanas, aconteceria algo que deixaria tudo incrível novamente, até alguém começar a brigar porque um pegou mais do que o outro... hahah..
Os bolinhos de chuva da Bá... O maior Gourmet do mundo pode se materializar na minha frente, com a garantia de que fará os bolinhos de chuva que se Deus come que eu saberia que eles ainda não chegariam aos pés daqueles bolinhos de chuva...
A massa sendo feita, e todos de olho, sabíamos, aguardávamos, o óleo esquentando, os bolinhos sendo jogados no óleo, afastávamos ao anuncio de que “dia espirrar”, aquele som, você sabe, o som de fritura, um dos melhores sons que existem na terra, ahhh a espera é cruel! Crianças aprendem a ser adultos esperando guloseimas ficarem prontas...desde pipocas até bolos assarem, aprendem a esperar, lidam com a frustração de que as coisas tem seu tempo, e que temos de respeitá-lo, isso é cruel... Enfiem, bolinhos branquinhos, bolinhos marronzinhos, escumadeira em punho, e eles começavam a ser resgatados do líquido mágico que os tornava comestíveis... Papel chuga e piscininha de açúcar eeee Voilá!
Primeiro que eles eram anunciados pelo cheiro que os precedia, e ansiedade tomava conta do ambiente, tinha que esperar esfriar, mas não muito, não pode comer a massa crua, dava dor de barriga (mentira que adulto conta pra criança!!!), banhá-los no açúcar, e o cheiro doce inebriava a todos que estivessem alí, crianças em transe inalavam a fragancia do anúncio do paraíso, ao som do “com calma, tem pra todo mundo, tudo bem, pode pegar..” o ataque era feroz, malabarismos eram ensaiados na tentativa de segurar mais de 5 bolinhos em uma mão...rsrsrs como se fosse necessário...
Eles eram macios, leves, uns mais queimadinhos, outros mais branquinhos, como os bolinhos de chuva de quem cuida de 6 crianças devem ser.. As “pontinhas” que formavam quando a massa era colocada dentro do óleo para fritar ficavam crocantes, e o açúcar em volta deixava de ser só açúcar, era algo mais... era uma riqueza disputada literalmente a tapa por 6 crianças..
As mordidas eram ao mesmo tempo que aproveitadíssimas ao som de Hummmmssss e com olhinhos fechados e ansiosas, loucas para que o bolinho durasse para sempre, mas torcendo para que ele acabasse logo para que você pudesse pegar o próximo...
Lembrando desses momentos eu morro de rir, e fico nostálgica também, penso que eu deveria ter mantidos meus olhos fechados por mais tempo, e não tido tanta pressa me pegar o próximo, mas sabe de uma coisa? Se não fosse assim, talvez não tivesse se tonado o momento, e sim só um momento.
Abençoada seja a Bá, por seus bolinhos de chuva, sua paciência, e seu amor. Abençoados sejam meu irmão, meus primos e os agregados, abençoado seja todo o meu passado!
Eu nunca soube porque Bolinhos de Chuva se chamam Bolinhos de chuva... pra mim sempre fez muito sentido que ele funcionasse como o intervalo perfeito entre uma brincadeira e outra, e esse intervalo era quase sempre relacionado a mudança do clima... o bolinho da hora que chove...pra ninguém ficar triste...hummmmmmmmmmmmmm
E aguarde... mais posts de momentos viram por aí... é a memória gustativa...